A REALIDADE NUA E CRUA
O QUE PODEMOS FAZER
Menores se sujeitam a perigos, drogas e fome, mas não voltam para casa
Emanuelle Coelho
Uma vida sem destino e esperanças, marcada pela exclusão, abusos, crimes, drogas e violências. Nas ruas, crianças e adolescentes trabalham em busca de alguns trocados, experimentam o frio, a dor, a fome e, muitas vezes, até o crime. A cama é feita de jornais e a comida, na maioria das vezes, está no lixo. Muitos encontram na cola, solvente ou outras drogas uma maneira de enganar a fome.
Em reportagem especial sobre menores que ficam pelas ruas, o Tribuna do Brasil conta a história de adolescentes que trabalham em busca de trocados. A maioria dos menores lava vidros de carro, vende balas ou pede esmola nas ruas, nas rodoviárias e em frente a comércios, para sobreviver.
CONHEÇA OS CASOS
“Me batia e dei umas facadas nele”
Em um dos semáforos próximo a rodoviária do Plano Piloto, Rafael (nome fictício) de 16 anos trabalha. Ele corre para lá e para cá. Quando o sinal fecha, é hora de ir para o outro. De carro em carro, pede a contribuição dos motoristas. Aos 13 anos, passou a viver nas ruas. O motivo? Saiu de casa porque apanhava do padrasto. Banho ele só toma de vez em quando, em um dos vários espelhos d’água existentes no Plano Piloto. “Tem vez que fico limpo, tem vez que fico sujo, depende”, relata o menino.
Em um dos semáforos próximo a rodoviária do Plano Piloto, Rafael (nome fictício) de 16 anos trabalha. Ele corre para lá e para cá. Quando o sinal fecha, é hora de ir para o outro. De carro em carro, pede a contribuição dos motoristas. Aos 13 anos, passou a viver nas ruas. O motivo? Saiu de casa porque apanhava do padrasto. Banho ele só toma de vez em quando, em um dos vários espelhos d’água existentes no Plano Piloto. “Tem vez que fico limpo, tem vez que fico sujo, depende”, relata o menino.
Rafael parou de estudar na 5º série. Depois que saiu de casa, começou a engraxar sapatos. “A pessoa vê que você está trabalhando e ajuda mais, mas roubaram minha caixa com material e eu passei a pedir dinheiro para comprar minhas coisas”, confessa. O menor ganha em média R$ 12 por dia e ainda consegue ajudar no orçamento da família. A mãe mora na região administrativa Recanto das Emas, com o padrasto e os dois irmãos do garoto. Ela trabalha como guardadora de carros no Núcleo Bandeirante. “Não vou para casa quando meu padrasto está. Ele me batia e eu dei umas facadas nele. Tenho medo de encontrá-lo e brigarmos novamente. Então ligo para minha mãe antes e pergunto, se ele não estiver, vou lá levar o dinheiro”, afirma o menino.
Quando a fome aperta e não tem dinheiro, Rafael cata comida no lixo. Segundo o garoto, apesar de todas as dificuldades, prefere viver nas ruas do que na companhia do padrasto. O maior sonho de Rafael é voltar para casa. “Só volto se meu padrasto não estiver mais lá. Ele chega bêbado e bate até na minha mãe. Mas ela parece mulher de malandro, mesmo assim ainda gosta dele”.
O menor, que diz ter se acostumado a viver nas ruas, possui uma marca no rosto e assume ter adquirido em uma briga. Drogas ele diz que não usa, mas admite fumar muito, há três anos. “Cato bitucas nas ruas”, comenta. Confessa já ter roubado e também já foi interno, por seis meses, no Centro de Atendimento Juvenil Especializado (Caje).
“Fumo porque é bom”
Com 12 anos, Guilherme (nome fictício) passou a morar nas ruas. Já são três anos convivendo com que o mundo tem de pior. As drogas já fazem parte da vida do garoto. “Fumei muito hoje. Fumo porque é bom”, declara. A mãe, moradora de Planaltina (GO), o visita de vez em quando. “Ela fala para eu voltar para casa. Mas não gosto de lá. Aqui é melhor, tenho liberdade. Ganho meu dinheiro e faço o que eu quiser com ele, em casa não é assim”, frisa Guilherme.
Segundo o menor, o motivo porque deixou a família foi sua opção sexual. “Sou homossexual e minha mãe não aceita”, confessa. Ainda meio tonto por causa dos efeitos da droga, Guilherme se recusa a continuar falando com a reportagem: “Você está perguntando demais, não vou mais responder”, afirma.
Outra rotina
Jéferson (nome fictício), 17 anos, conheceu bem a vida nas ruas. Hoje mora em uma casa de menores, trabalha, estuda e já pode planejar um futuro melhor. Para o adolescente, as piores coisas na rua são a droga e a fome. “Temos que usar drogas e até roubar”, relata.
Jéferson (nome fictício), 17 anos, conheceu bem a vida nas ruas. Hoje mora em uma casa de menores, trabalha, estuda e já pode planejar um futuro melhor. Para o adolescente, as piores coisas na rua são a droga e a fome. “Temos que usar drogas e até roubar”, relata.
ALTERNATIVAS
A Secretaria de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda do Distrito Federal (Sedest), órgão responsável pela questão dos meninos de rua, não tem estimativas de quantos existem em todo o DF. Pesquisas apontam que são vários os motivos para que uma criança procure a rua para substituir o lar, vão desde a falta da presença dos pais em casa à violência sexual doméstica. Estatísticas demonstram que apenas 2% dos meninos que moram na rua realmente não têm família ou algum parente que os ampare. Os outros 92% estão na rua para fugir da agressão física sofrida pelos pais ou responsáveis, por um eventual envolvimento com drogas e ainda pela inexistência de carinho e amor em casa.
A Secretaria de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda do Distrito Federal (Sedest), órgão responsável pela questão dos meninos de rua, não tem estimativas de quantos existem em todo o DF. Pesquisas apontam que são vários os motivos para que uma criança procure a rua para substituir o lar, vão desde a falta da presença dos pais em casa à violência sexual doméstica. Estatísticas demonstram que apenas 2% dos meninos que moram na rua realmente não têm família ou algum parente que os ampare. Os outros 92% estão na rua para fugir da agressão física sofrida pelos pais ou responsáveis, por um eventual envolvimento com drogas e ainda pela inexistência de carinho e amor em casa.
Segundo Eustáquio Coutinho, assessor técnico da Vara da Infância e Juventude (VIJ), a maioria das crianças e adolescentes que vivem nas ruas do DF tem laços familiares. “Alguns são do entorno, outros de Planaltina, Samambaia, Sobradinho, Ceilândia e ficam em áreas como Setor Comercial e Conic”, exemplifica.
De acordo com o assessor, questões sociais são os maiores motivos para os menores fugirem de casa e aprenderem a sobreviver nas ruas. “Maus tratos, abuso e desemprego dos pais são motivos que caracterizam fuga de casa por parte das crianças”, relata Coutinho.
Entre dar ou não esmolas para as crianças de rua, o assessor técnico da VIJ é bem claro: “Nunca dê esmola. Qualquer pessoa parte o coração ao ver o menino na rua, mas a esmola é um incentivo a continuar. Se quiser doar, há muitas instituições que podemos contribuir. Para que ficar dando esmolas na rua?”, indaga.
Eustáquio ressalta que o problema dos meninos de rua é social. “Temo como tirá-los da rua? Tem sim, com programas sérios, que deem apoio, consistência, acompanhamento, porque essa coisa de tirar da rua sem condições de atender não adianta. Tem que haver programas e projetos”, opina.
Toda criança e adolescente moradores de rua estão em situação de risco, por isso há intervenção da Vara da Infância. “Sempre discutimos aqui na VIJ essa história de pegar a criança e levar para casa sem assistência adequada. O pai às vezes é usuário de drogas ou alcoólico e o menino retornava para rua”, esclarece. “Em virtude desses casos, surgiu o programa VIJuventude, onde fazemos o acompanhamento de adolescentes e até crianças em situação de risco, envolvidos com drogas, principalmente o crack”, cita o assessor.
O Programa VIJuventude é voltado para a inclusão social de crianças e adolescentes que vivem em situação de rua na área central de Brasília. A meta é desenvolver um conjunto de ações que permitam o acesso dessas crianças e adolescentes a oportunidades e serviços. O trabalho, iniciado há sete meses, atende 13 adolescentes, de 12 a 17 anos. Segundo a VIJ, o diferencial do trabalho é o atendimento individualizado, a partir do qual se procura detectar os motivos, problemas ou dificuldades que levaram a criança ou adolescente para a rua, com o intuito de se buscar soluções ou alternativas que melhorem suas condições de vida e também as de sua família, para que o atendido não precise mais viver em situação de risco social. Os atendidos têm à disposição cursos profissionalizantes e de capacitação, atividades de educação, cultura, esporte e lazer.
Andre Borges
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